Última parte dessa seção, galera. Estão aí as duas últimas críticas antigas que possuo. E essas são pra fechar com chave de ouro. Quando saí da sala de exibição de "UP - Altas Aventuras", estava extremamente comovido com o filme e, modéstia a parte, consegui fazer uma das minhas melhores e mais inspiradas críticas. Já "Salve Geral" tem todo um significado especial para mim, pois consegui participar da coletiva de imprensa do filme em São Paulo e assistir à pré-estréia exclusiva para convidados na capital paulista. Obrigado, Regina Colon! hehehe... Pois bem, aí estão as críticas dos dois filmes:
Crítica "Up - Altas Aventuras"
“É isso que gosto nos filmes da Disney-Pixar: eles não são só pra crianças” comentava uma amiga minha na saída do cinema. E realmente, “UP – Altas Aventuras” contém alguns temas bem fortes em sua trama, mas que aparecem naturais à história e não são para os menores. Aliás, talvez essas tais tramas passem imperceptíveis à criançada, como morte e esterilidade. Mas isso é só uma pequenina parte de um filme ótimo e divertido que nos emociona e faz rir o tempo todo.
A história começa apresentando o pequeno Carl Fredriksen (Edward Asner no original e Chico Anysio na versão brazuca), um menino sonhador que adora as alturas e conhece a falante Ellie, que tem o mesmo sonho de levar a sua casa para um vale de cachoeiras na América do Sul. Depois de uma vida inteira juntos, Ellie se vai e Carl, já com 78 anos, resolve realizar o sonho de sua amada de levar a casa em uma aventura pelo sul. Assim ele põe o imóvel nos ares com milhões de balões cheios de gás hélio, mas acaba levando junto o jovem escoteiro Russel (Jordan Nagai). Juntos eles vivem várias e boas aventuras na floresta equatorial.
Animações não são, claro, como filmes em live-action, e os animadores da Pixar sabem muito bem disso. Tanto sabem que aproveitam para inserir características de personalidade na própria estrutura física da personagem. É o que acontece com Carl, que aparece, literalmente, quadrado quando velho. Característica essa que é sempre reforçada em várias cenas dele em casa.
O diretor da produção é Pete Docter, o mesmo por trás de “Monstros S.A.” e é fácil perceber por que os dois filmes dele são os mais emocionantes da parceria Disney-Pixar. Docter consegue mexer com assuntos fortes de maneira sensível (como comentei no começo), e envolve os espectadores de maneira espetacular. Talvez esse último fator não seja exclusivo de Docter, mas algo exigido de todos os diretores pela Pixar, o que os leva a um sucesso após o outro.
Ponto a favor também da arte e da trilha sonora do filme (creditadas respectivamente à Ralph Eggleston e Michael Giacchino), que casam perfeitamente mesclando momentos mais tristes, onde as cores são mais frias e a música-tema ganha um tom mais emocionante, e momentos alegres, com cores vibrantes e a mesma música em acordes agitados.
Chico Anysio (assisti dublado!) não escorrega na dublagem, mas também não surpreende. E como a maioria dos filmes com o selo da Pixar tem seu coadjuvante “bobão-carinhoso”, o cachorro Dug assume o posto roubando a cena. Mas igualmente cativantes são o garoto Russel e a ave Kevin (que apesar de não falar nada compreende muito bem o que os outros dizem).
Antes de tudo, “UP – Altas Aventuras” está aí para nos mostrar as belezas que existem nas coisas mais simples da vida e que, uma vida ao lado de quem gostamos e amamos, pode ser a aventura mais maravilhosa de nossa existência.
Crítica "Salve Geral"
É difícil retratar um o caos com sutileza. O diretor Sérgio Rezende (de “Zuzu Angel”) faz isso muito bem em “Salve Geral”, longa escolhido para representar o Brasil na corrida pelo Oscar. Digo retratar com sutileza pois, apesar de o diretor correr com a narrativa no começo, o filme é sobre uma mulher e seu filho, com o ataque do Primeiro Comando da Capital (o famigerado PCC) como pano de fundo, e não vice-versa.
Na história, Lúcia (Andréa Beltrão) se encontra com problemas financeiros, tendo que baixar o padrão de vida. Seu filho, Rafa (Lee Thalor) não aceita, e em uma noite que sai com um amigo, acaba cometendo um crime e é preso. Encarcerado, o rapaz se envolve com o tal Comando da Capital enquanto sua mãe, desesperada, faz de tudo para tirar o filho da prisão.
Explicando a minha deixa inicial, a narrativa chega a se atropelar um pouco no começo do filme, tudo para mostrar a situação em que se encontram os protagonistas (mãe e filho) e inseri-los naquele mundo carcerário, onde comanda o PCC. Mas nada que atrapalhe muito o filme, que se foca em Lúcia e todas as atitudes que toma em função do filho. E aí sim eu falo do “mostrar o caos com sutileza”. O diretor consegue passar a sensação do caos apenas pela visão de Lúcia e Rafa. Ela enquanto classe média (alta, representada pela irmã, vivida por Cris Couto; e baixa, representada pela própria personagem), e ele enquanto preso participante do movimento. Rezende não precisa mostrar o tumulto forçadamente, a movimentação surge natural de cenas em que Lúcia passa pela rua e as lojas vão se fechando atrás dela, pelo trânsito que ela enfrenta, pela (impressionante) imagem dela andando sozinha pela Avenida Paulista e, principalmente, pelos locutores do rádio que ela tanto ouve a procura de informações sobre o filho.
Outro ponto que é muito característico de Rezende no filme é o excesso de closes que ele dá em rostos, olhos, mãos e armas. Muitas vezes se encaixa perfeitamente, tornando o filme poético e delicado, mas a repetição da técnica se mostra desgastante e imprópria em outras cenas. Porém, o tato do diretor em evitar mostrar mortes diretas é ponto a favor dele (ou jogada de marketing pra diminuir a censura!).
A sempre presente trilha sonora de Miguel Briamonte traz fantásticas músicas instrumentais que norteiam o filme e tentam se mostrar, algumas vezes, natural à vida daquelas pessoas, seja quando Lúcia toca piano ou quando ouve algo em um rádio por perto.
Ponto a favor também da fotografia de Uli Burtin, que nos momentos de mortes se mostra bem escura e, em uma única cena de vida (quando nasce um bebê) traz um branco ofuscante a là “Ensaio sobre a cegueira” colocando os contrapontos formidavelmente.
Beltrão traz Lúcia a vida de maneira excepcional, mostrando uma mulher forte e determinada, contrapondo a personagem Ruiva, vivida também de maneira brilhante por Denise Weinberg, uma advogada corrupta que ajuda o PCC. Aliás, o filme expõe muito bem a oposição entre as duas, claramente antagonistas.
Sérgio Rezende tem uma obra prima nas mãos, que irá se expandir para todo o Brasil devido ao anúncio de escolhido como representante brasileiro para o Oscar. Agora é prestigiar e torcer!