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sexta-feira, 2 de junho de 2017

Crítica: 'Mulher-Maravilha'

Mulher-Maravilha” é o quarto filme do universo cinematográfico da DC no cinema, seguido de “Homem de Aço”, “Batman vs. Superman: a origem da justiça” e “Esquadrão Suicida”, e é o primeiro que realmente faz a nova linha temporal construída pelo selo por trás da Liga da Justiça decolar de vez.

Na história, Diana (Gal Gadot, de “Batman vs. Superman”) cresceu aprendendo a batalhar na ilha secreta de Themyscira, onde as amazonas vivem longe da humanidade. Quando o piloto militar Steve Trevor (Chris Pine, de “Star Trek”) acidentalmente cai na ilha, a futura Mulher-Maravilha tem conhecimento sobre uma tal guerra mundial, e resolve partir junto com o soldado para lutar no campo de batalha.

O roteiro assinado por Allan Heinberg (que escreveu para as séries “The Catch” e “Grey's Anatomy”) a partir do argumento criado por Jason Fuchs e Zack Snyder (diretor de “Batman vs. Superman”) tem uma história bem definida, trazendo todos os famosos itens da Mulher-Maravilha, entre o laço da verdade, os braceletes, a espada e o escudo, de maneira condizente com aquele universo e com finalidades bem definidas.

O espectador acompanha a história junto a Diana, sendo impossível não se envolver com a pureza da heroína diante daquele “mundo dos homens”. A diretora Patty Jenkins (do excelente “Monster – Desejo Assassino”) trabalha junto com o roteiro um tema forte como a igualdade de gênero, sem a necessidade de argumentos feministas, uma vez que Diana é uma mulher que nasceu e cresceu em uma sociedade só de mulheres e, para ela, simplesmente não há motivos para ser submissa ou não ter os mesmos direitos que os homens (e há?). O debate pelos direitos iguais surge naturalmente por meio da ingenuidade da personagem. É claro que a personalidade da protagonista colabora para o seu posicionamento diante das situações. Já na ilha de Themyscira, Diana enfrentava decisões de sua mãe, maior autoridade do local, e na Inglaterra torna a contestar ordens de generais superiores a Steve Trevor.

É essa ingenuidade da personagem, aliás, que contribui também para que este seja o filme com o tom mais leve e descontraído do universo DC até então, sem que o humor surja de maneira forçada. Gadot está bem à vontade no papel da personagem, sendo essa a segunda vez que a interpreta, trazendo carisma, paixão e conquistando o espectador com o forte caráter da Mulher-Maravilha. Pine faz um ótimo trabalho como Steve Trevor e sua química com Gadot funciona na tela. Os demais integrantes do grupo que segue na aventura junto com Diana e Steve (formado pelos atores Saïd Taghmaoui como Sameer, Ewen Bremner como Charlie e Eugene Brave Rock como The Chief) são engraçados e servem ao seu propósito, mas nunca chegam a ser realmente desenvolvidos. As amazonas, em especial Connie Nielsen como a rainha Hippolyta e Robin Wright como Antíope, acabam tendo pouco tempo de tela, mas dominam as cenas em que aparecem.

Robin Wright lidera as amazonas em batalha como Antíope.
Aliás, o estilo de luta das amazonas é único, bem desenvolvido e muito bonito de se assistir. No entanto, apesar das câmeras lentas durante várias das cenas de batalha ajudarem a demonstrar detalhadamente os belos movimentos de luta que talvez passassem despercebidos a olho nu, o recurso é usado de forma exaustiva e chega a incomodar um pouco a certa altura.

Outro método utilizado por Jenkins para demonstrar a incrível rapidez de Diana são os cortes com a personagem em diferentes lugares, repentinamente, de uma cena para a sua conseguinte. O conceito é interessante, mas fica estranho aos olhos do espectador durante a projeção, assemelhando-se mais a um erro de montagem do que a um recurso do filme propriamente.

As sequências no campo de batalha são muito bem realizadas e conseguem demonstrar ao público várias das habilidades da Mulher-Maravilha, que por sua vez revela todo o seu potencial na batalha final da produção, quando a personagem finalmente descobre quem é e mostra sua evolução durante a história.

Tudo isso ainda ganha uma belíssima moldura por meio da maravilhosa (desculpe o trocadilho) fotografia de Matthew Jensen (do ótimo “Poder sem limites"), principalmente na ilha de Themyscira, que se torna um verdadeiro paraíso, e da trilha sonora, aqui assinada por Rupert Gregson-Williams (do oscarizado “Até o último homem”), mas que tem seu auge ao som do tema da personagem, criado por Junkie XL e Hans Zimmer para “Batman vs. Superman”. Ponto positivo também para Lindy Hemming, responsável pela ótima reconstrução do figurino de época da Europa da década de 1910, e a criação do figurino das amazonas, que remete à Grécia antiga e as caracterizam como guerreiras que são.

“Mulher-Maravilha” é um ótimo filme que traz mais esperança ao universo DC que o símbolo no uniforme do Superman. Assim como ela aparece para salvar o dia no filme de confronto dos heróis, sua aventura solo chega para resgatar o estúdio de uma avalanche de críticas negativas.

Saïd Taghmaoui como Sameer, Chris Pine como Steve Trevor, Gal Gadot como Diana Prince, Eugene Brave Rock como The Chief e Ewen Bremner como Charlie. Pose para a foto que já havíamos visto em "Batman vs. Superman".

P.S.: Ah sim, e a vilã Dra. Veneno, infelizmente, acaba sendo desperdiçada na produção, sem desenvolvimento algum de uma personagem que parecia ser bem interessante.




quarta-feira, 24 de maio de 2017

Crítica: 'Corra!'


Se você tem medo de assombrações, pode ficar tranquilo, pois “Corra!” (“Get out”, no original), é um suspense psicológico sem nenhum elemento vindo do além. Por outro lado, o filme dirigido e escrito por Jordan Peele (estreante na cadeira de diretor), traz ao público não só momentos de tensão do jeito que os amantes do estilo adoram, como também uma forte crítica social e racial.

A premissa é simples: namorado viaja para o interior para conhecer a família da namorada. No entanto, Cris (Daniel Kaluuya, de “Sicario: terra de ninguém”) é um jovem negro que teme pela reação dos pais de sua namorada caucasiana, Rose (Allison Williams, da série “Girls”), ao se depararem com a diferença racial entre o casal. E é durante esse encontro que algumas atitudes e reações começam a parecer estranhas para Cris.

O roteiro da produção é ótimo. Peele consegue entregar uma história completa, sem deixar pontas soltas, e na qual tudo tem seu propósito para contribuir com a narrativa. Como um bom suspense psicológico, o roteiro consegue prender a atenção do público dentro de seus 104 minutos de projeção, entregando momentos que pegam o espectador de surpresa em sustos nada óbvios. Há toda uma sequência mais gore durante a produção, mas que parece natural à trama, na altura em que se inicia.

Cris encontra os pais de sua namorada, mas algo estranho está acontecendo naquela casa.

 “Corra!” é, antes de tudo, um exemplo de “como se fazer um bom filme”. A direção de Peele também está completa, sem muitos pontos altos, mas também sem pontos baixos. O elenco está afiado e entrega boas atuações, com personagens convincentes, completos e com propósitos bem definidos durante a trama. A fotografia do filme (assinada por Toby Oliver) conversa com o gênero naturalmente e a produção de arte acerta na escolha da paleta de cores, principalmente para o figurino (assinado por Nadine Haders), que também conversa naturalmente com a trama.

No entanto, a produção é tão bem montada e bem escrita, que é inevitável não chegar a prever o que está acontecendo antes mesmo da grande revelação, inclusive com dicas dadas em falas de alguns personagens, o que poderia ser descartado em benefício da descoberta de toda a trama que ocorre no ato final.

Para todos que quiserem aproveitar um bom filme, com uma boa história, que realiza críticas sociais sem torná-las forçadas, “Corra!” é uma ótima pedida. Você levará alguns sustos no caminho, mas a produção vale a pena mesmo para os que não são fãs de suspense.


Ei, já que você está aqui, aproveite para conferir minha crítica sobre "La La Land - Cantando estações" também!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Crítica: 'La La Land - Cantando estações'

Uma poética homenagem ao cinema e aos antigos musicais, envolta em meio a muito jazz e um romance ao melhor estilo de Hollywood. Essa é a proposta do musical cotado como um dos favoritos ao Oscar 2017, “La La Land – Cantando estações”.

A história acompanha a atriz Mia (Emma Stone, de “Birdman” e “Magia ao Luar”), que aspira conseguir seu grande papel de destaque na indústria cinematográfica, e o músico Sebastian (Ryan Gosling, de “Dois Caras Legais” e “A Grande Aposta”), que tem o sonho de abrir seu próprio clube de jazz. Os dois se encontram por acaso e acabam se envolvendo em um romance puro, por entre as ruas de Los Angeles.

O diretor e roteirista Damien Chazelle (dos ótimos “Whiplash - Em Busca da Perfeição” e “Rua Cloverfield, 10”, apenas roteirista nesse último) consegue não só trazer um belo romance entre os protagonistas, como realiza uma incrível homenagem de duas horas aos antigos musicais de Hollywood, em um roteiro bastante metalinguístico, dando forma a emoções por meio de músicas e seguimentos de dança inesquecíveis e cheios de referências.

É impossível não lembrar títulos como “Cantando na Chuva” ou “Sinfonia em Paris” durante as longas sequências e planos-sequências que o diretor usa nos números musicais, além das coreografias realizadas com sapateado, estilo clássico desse tipo de filme. As emoções ganham vida não só com danças e canções, mas com algumas cenas lúdicas, como a do observatório, durante a apreciação das estrelas pelo casal protagonista, em um seguimento belíssimo e poético.


Apesar do título em português, as estações do ano pouco importam em seu sentido literal aqui (mesmo porque não há grande diferença de uma para outra em Los Angeles), mas fazem um paralelo aos estágios do relacionamento do casal. Quanto mais “quente” a estação, mais envolvidos Sebastian e Mia estão, e quanto mais “fria”, mais longe um do outro se encontram.

Ryan Gosling e Emma Stone estão ótimos em seus papéis. Além de uma química perfeita entre o casal, a homenagem à sétima arte vem também na atuação, seja com algumas reações propositalmente exageradas, seja com toda a forte expressão física das sequências musicais.

A fotografia de “La La Land” é tão romântica quanto o filme, brincando com uma paleta de cores intensas o tempo todo e trazendo ótimos planos do entardecer de Los Angeles. O diretor de fotografia Linus Sandgren (de “Joy: O Nome do Sucesso” e “Trapaça”) faz um excelente trabalho em parceria com o cenografista David Wasco (de “Bastardos Inglórios” e “Colateral”), que por sua vez abusa das cores vivas para trazer o lúdico ao dia a dia dos personagens.

“La La Land – Cantando estações” é uma excelente obra da sétima arte que homenageia o próprio cinema da maneira mais bela e poética possível. Se vai ganhar algum Oscar? É muito provável. Mas a única certeza que levamos é a de que merece, enquanto obra de arte e enquanto homenagem metaliguística.

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Confira também as críticas de "Rua Cloverfield, 10", escrito por Damien Chazelle, e do brasileiro "Aquarius".
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